segunda-feira, 2 de novembro de 2015

AMERICAN HORROR STORY - ASYLUM



Por Diego Betioli

"Se você olhar para o mal, o mal olhará de volta para você".

Se imagine como um fã de terror desde que se conhece por gente, e imagine encontrar em uma única série todos os  elementos mais fantásticos do horror - inclusive psicológico - atrelados a um roteiro fantástico, cheio de personagens incrivelmente carismáticos, o que raramente é bem trabalhado no gênero. Esta é a segunda temporada de American Horror Story, Asylum - em minha modesta opinião, uma obra prima de terror.
Gostei muito da primeira temporada, Murder House. A temática de uma casa repleta de mistério e espíritos aprisionados por rancor parece clichê, mas foi muito bem trabalhada por Ryan Murphy, que conseguiu dar uma ótima profundidade aos personagens - tanto os vivos quanto os mortos - com o auxílio de um elenco de peso com nomes como Jessica Lange, Zachary Quinto, Sarah Paulson e Evan Peters. Foi o suficiente para que eu encarasse a próxima temporada, cuja temática por si só já me despertara a atenção - um manicômio!
A ideia de uma instituição psiquiátrica ainda permanece assustadora em nosso inconsciente coletivo, imaginando pacientes mal tratados, sofrendo todo tipo de "tratamento", em condições precárias, de modo a agravar ainda mais suas condições e jamais auxiliá-los ou curá-los de fato, o que era uma prática comum até boa parte do século XX - ser internado em um manicômio podia ser considerado o fim de uma pessoa: não havia mente e corpo que suportassem a atmosfera de tal ambiente e a simples ideia de tal lugar era mais assustadora que a reclusão em uma penitenciária. 
É exatamente em um recinto como este que a série é ambientada, nos anos 60: Briarcliff, um antigo hospital que tratava tuberculosos (onde dezenas destes morreram, em um período no qual a doença fora extremamente letal), agora sob os cuidados da Igreja Católica, sob o comando do Monsenhor Thimoty (Joseph Phiennes) e a Irmã Jude (Jessica Lange). Os métodos aplicados aos pacientes são completamente inapropriados e tortuosos, os quais sempre justificados em nome de purificação e ordem.



As coisas começam a tomar um novo rumo em Briarcliff com a chegada de Kit Walker (Evan Peters), suspeito de ser o serial killer conhecido como Bloody Face. A presença do suposto assassino na instituição atrai a presença do Dr. Thredson (Zachary Quinto), que possui um interesse peculiar no caso de Kit, e da repórter Lana Winters (Sarah Paulson), cuja limitada carreira a faz enxergar em Bloody Face a grande chance para um salto profissional. A relação entre estes personagens desencadeia os eventos chaves que se sucedem no manicômio, tomando rumos cada vez mais inesperados - e fazendo o espectador perder o fôlego a cada reviravolta.
Briarcliff ainda tem muitos outros personagens fundamentais à trama e extremamente envolventes, como a Irmã Mary Eunice (Lilly Rabe), o intrigante e assustador Dr. Arden - brilhantemente interpretado pelo renomado James Cromwell - e Grace (Lizzie Brocheré), uma paciente aparentemente lúcida que logo faz amizade com Kit.
Não obstante ao horror de um manicômio, e como supracitado, Asylum apresenta, ao longo de sua narrativa, menções ao horror fictício e real da época então retratada - elementos como exorcismo, nazismo, ufologia e ciência experimental, fazendo um mix de elementos de horror religioso e científico de forma impecável. A trama ainda aborda temas tabus como racismo, homossexualidade e bigamia e como tais eram tratados à época.



Há ainda uma conexão com uma narrativa no tempo presente (aliás, é assim que a série começa), o que é explicado posteriormente, de forma gradativa no decorrer dos treze episódios da temporada. Aliás, as narrativas de tempo, de modo especial os flashbacks, se mostram como um dos pontos fortes tanto na primeira quanto na segunda temporada de AHS. Outro fator a se destacar é como, por incrível que pareça, é fácil desassociar os atores desta temporada de seus papéis na primeira (boa parte do elenco é o mesmo, característica da série), mostrando a força do elenco e dos personagens da estória. O carisma e a profundidade dada a cada um deles é tamanha que, em determinado momento, você se vê torcendo por alguém que considerava desprezível há um episódio atrás. A trilha sonora também é perfeita, criando a perfeita atmosfera de um hospício. Pra se ter ideia, esta é a música tocada todo dia no salão principal de Briarcliff.
As temporadas de AHS são independentes umas das outras. Portanto, se gostou ou não da primeira, garanto que esta será uma experiência completamente diferente - e imprescindível para os amantes de terror.


domingo, 4 de outubro de 2015

CIDADES DE PAPEL


Por André Betioli

Baseado no livro homônimo do autor John Green (A Culpa é das Estrelas), esta é a segunda adaptação de uma obra literária do autor. Com uma proposta um pouco diferente da adaptação anterior, Cidades de Papel (Paper Towns, 2015), se saiu muito bem.

A trama mostra Quentin (Nat Wolff) e Margo (Cara Delevingne), amigos desde a infância, e hoje adolescentes, Quentin sempre nutriu uma paixão por ela. Margo sempre foi mais aventureira, e assim ela sempre gostava de fugas, e costumava deixar pistas para os outros a encontrarem. Certo dia ela simplesmente desaparece, e desta vez as pistas estavam lá mais uma vez e assim Quentin, acaba embarcando em uma investigação para encontrar Margo.


Ao olhar assim, a premissa parece bem básica e só por isso, já dá pra montar um pouco de como o filme vai ser do início ao fim.  E antes de assistir, havia visto muitas opiniões divergentes, uns gostaram muito e outros odiaram. E acredito que boa parte dos que acabaram não gostando, foi justamente por filme não seguir a risca essa expectativa que montamos em nossa cabeça. Mais ou menos perto da metade do longa, a coisa já se transforma e o filme fica em um ritmo e proposta um pouco diferente do começo dele. E ao meu ver, este foi o grande atrativo, pelo menos para mim.


O filme tinha tudo para ser um grande clichê. Mas quando Quentin começa sua busca por Margo, acabamos por conhecer os seus melhores amigos, Ben (Austin Abrams) e Radar (Justice Smith). E a partir deste ponto, o filme dá uma virada, porque o filme acaba se transformando de um filme só sobre um amor adolescente, para uma verdadeira jornada de auto descobrimento e amizade. Pode-se dizer que ele se torna um "road movie" adolescente.


Há certas diferenças entre o livro e o filme, e sinceramente o filme acaba por se sair melhor, pois conseguiu captar a essência da obra literária e colocá-la na tela, com mais agilidade, sem deixar cair o ritmo, que é uma coisa que acaba acontecendo no livro. O elenco está bem também, assim como a trilha sonora que ajuda a embalar a aventura. O filme também consegue fazer algumas homenagens a ícones da cultura pop como Game of Thrones e Pokémon (este momento é muito bom). Acho que a única ressalva é que os personagens poderiam ter se aprofundado um pouco mais em seus dilemas, mas isso não compromete a obra.

Não é o melhor filme do mundo, nem de longe é o pior também. A obra se torna uma grata surpresa, principalmente pelo seu final. A meu ver o filme cumpriu seu papel em mostrar um pouco da fase da adolescência, suas complicações.



 Sabe aquela expressão: " O caminho é mais importante que a chegada?" O filme consegue retratar bem isso.  Um bom filme que consegue divertir e nos fazer pensar um pouco.
 



 

sábado, 3 de outubro de 2015

O QUE NÓS FIZEMOS NO NOSSO FERIADO


Por André Betioli

Abi (Rosamund Pike) e Doug (David Tennant) são um casal passa por dificuldades no relacionamento, e estão tendo complicações em lidar com isso, de falar da situação para os seus 3 filhos. O aniversário do pai de Doug, Gordie (Billy Connolly) chega, e a família tem que se reunir e ir para a festa do patriarca da família. Eles têm a missão de manter as aparências para os outros familiares, como se tudo estivesse ótimo, pois não querem se expor e também não querem magoar Gordie, além do que ele anda com a saúde debilitada. Mas a viagem guarda muitos fatos por vir, que mudará todo o curso da vida deles.


O grande atrativo do filme, é a sua agilidade e simplicidade em descomplicar assuntos complexos. Grande parte do filme temos os 3 filhos do casal como protagonistas e pelos olhos deles vemos os adultos agindo com infantilidade, brigando por quaisquer motivos, magoando uns aos outros, enquanto os pequenos mostram a maturidade que lhes falta aos grandes. E ao ter aqueles diversos questionamentos sobre a vida, vemos como muitos assuntos pesados como divórcio, vida e morte, amizade, família são tratadas aqui de maneira simples, mas com um direcionamento ao espectador.


Os diálogos são incríveis. E além das atuações belíssimas do elenco, são nas conversas ágeis que se encontram os grandes momentos do filme. Tudo é sútil, mas ao mesmo tempo forte. E também muito, muito engraçado, há vários momentos hilários muito bem introduzidos na trama.  A fotografia do filme é belíssima, mostrando a riqueza da Escócia por diversos ângulos.

O Que Nós Fizemos No Nosso Feriado (What We Did On Our Holiday, 2014) é filme consegue ser engraçado, divertido, reflexivo e emocionante, tudo no tempo certo. É aquele drama mesclado com comédia na medida no ponto. Pra quem gostou de por exemplo," A Pequena Miss Sunshine", sem dúvidas vai curtir esse daqui.




Totalmente recomendável! 
É aquele tipo de filme que te faz bem ao assistir.

terça-feira, 29 de setembro de 2015

UMA GARRAFA NO MAR DE GAZA


Por André Betioli

Uma jovem francesa chamada Tal vive em Jerusalém, que está em um momento conturbado devido a guerra com os palestinos. Tentando entender os porquês da guerra, ela lança uma garrafa ao mar com uma carta dentro. A mesma acaba parando em um mar em Gaza, onde um jovem palestino chamado Naim encontra a garrafa e lê a carta. Na careta de Tal, ela havia deixado um e-mail para contato, mesmo que sem nenhuma esperança que alguém encontrasse a garrafa. Mas Naim fica interessado em conversar, e a partir daí, mesmo em condições adversas, os dois passam a trocar emails, e desse ponto em diante eles conseguem se comunicar e uma amizade entre eles acaba nascendo.


Em meio ao caos e horrores da guerra, e estando de lados opostos, os dois começam a criar uma verdadeira amizade, pois nenhum dos dois consegue entender do porque de tanta guerra e sangue derramado. O cenário criado pelo filme é perfeito para se sentir o peso da guerra e o quão horrível ela pode ser. Um simples dia, um simples oi para alguém pode significar a morte. Toda a liberdade é tirada, e aquelas coisas simples do cotidiano passam a ser um sonho distante.

O desenvolvimentos dos dois protagonistas é excelente. Além dos problemas da guerra, ambos passam por momentos conturbados em suas vidas pessoais, e em relacionamento com suas famílias. Escolhas, futuro, tudo isso é posto em cheque. E de uma maneira simples e sensível, mas não menos impactante, vemos dois jovens tentando entender o mundo e buscar um lugar nele, se isso ainda é possível. A relação dos dois é muito bela e muito bem construída.


O filme Uma Garrafa No mar de Gaza (Une Bouteille à la Mer, 2012) é incrível, com um mensagem universal sobre guerra e o valor da amizade, mesmo com tantas adversidades que o mundo pode nos causar, e ainda assim termos um pouco de esperança.

“Nada é simples entre nós, o que não significa que seja impossível” .





Ótimo filme! Sem dúvidas vale à pena! Encantador e ao mesmo tempo forte, impactante!

    


terça-feira, 22 de setembro de 2015

QUAISQUALIGUNDUM


Por Diego Betioli

O universo dos quadrinhos, bem como o dos livros, tem o dom de nos proporcionar ricos detalhes sobre qualquer tipo de história, de qualquer tema. Qualquer um mesmo, e não há barreiras culturais quando estamos falando de arte. E porque não combinar música e quadrinhos? Estamos falando de arte!
Quaisqualigundum é mais um exemplo de como as HQs são tão ricas pluralmente quanto o universo literário. O tema? A obra do mestre Adoniran Barbosa, ícone do samba e patrimônio cultural paulistano, cujas canções foram imortalizadas em sua voz rouca e especialmente ao som dos lendários Demônios da Garoa. Quem nunca ouviu e cantarolou Trem das Onze?
Adoniran compunha sobre o cotidiano, histórias de pessoas que conhecia ou situações que presenciava, e que logo lhe davam ideias de como teriam acontecido. E isso rendeu muito samba - e porque não material literário? As histórias do cotidiano sempre fascinam, talvez pela proximidade que temos com elas. Estamos inseridos nelas!
Ou seja. a HQ dá vida aos personagens narrados em alguns dos sambas mais famosos do compositor, como Saudosa Maloca e Samba do Arnesto, explorando com o mesmo bom-humor e linguagem as situações hilárias - e por vezes dramáticas  e tocantes - daqueles sujeitos que representaram a rotina de uma São Paulo antiga, mas que ainda encontra espelhos bem atuais.



E a grande sacada de transformar os sambas de Adoniran em HQ - não apenas transformar, mas viajar neles - foi do renomado quadrinista Roger Cruz, que, entre outras atuações, foi um dos principais desenhistas dos X-Men nos anos 90. Roger, no entanto, é quem assina o roteiro - a arte fica por conta de Davi Calil, cujo traço é a síntese perfeita do estilo caricato das composições de Adoniran e o retrato de uma São Paulo bairrista e cheia de pequenas grandes histórias pra contar.
É impossível não sorrir, rir e se emocionar com cada capítulo - além de uma grande sacada do autor no final (quase um easter egg). E claro, impossível também não querer saber mais sobre Adoniran e sua obra, já que provavelmente Trem das Onze ficará em sua mente instantaneamente após a leitura.
Vale muito a pena conferir. E se possível - uma experiência que eu deveria ter feito - leia a HQ ao som do próprio. Deve ser ímpar!





Excelente! ♫ Se eu perder esse trem...♪




domingo, 20 de setembro de 2015

COM MÉRITO


Por André Betioli

Certa noite ao pesquisar algum filme para assistir, eis que encontrei esse filme, li a sinopse e em seguida vi o poster com atenção, e reparei no elenco, muito bem composto com nomes como Patrick Dempsey, Brendan Fraser e Joe Pesci e afins. E Com Mérito (With Honors, 1994) não decepciona, na verdade foi uma grata surpresa!

Na trama temos Monty (Fraser), um estudante de Havard  que mora com alguns amigos no campus e que está prestes a finalizar sua tese. Mas um imprevisto ocorre, e o arquivo da sua tese acaba caindo nas mãos de Simon (Pesci), um morador de rua. Para recuperar o material, eles fazem um acordo: para Simon lhe devolver a tese, Monty teria que cumprir alguns favores a ele, como por exemplo arrumar comida, uma casa e outras coisas. Depois de um início tumultuado e cheio de farpas, o que era uma briga acaba por se tornar o  começo de uma grande amizade entre os dois, e consequentemente com os amigos de Monty.

O filme de cara parece que vai ser bem pastelão, leve e bem descontraído, e em alguns momentos ele até é. Mas conforme o longa vai se desenrolando, a obra vai para um outro lado, fazendo-nos refletir muito acerca da vida, trabalho, família, amizade e amor. E tudo isso apresentado de uma maneira sútil, que vamos acompanhando naturalmente quando ocorre o aprofundamento dos personagens.
 É um filme despretensioso no início, mas que acaba fisgando o telespectador. O elenco e trilha sonora ajudam a completar a qualidade da obra.





 Excelente filme! Um grande achado!


segunda-feira, 9 de fevereiro de 2015

STAR WARS LEGENDS - BOBA FETT




Por Diego Betioli

Confesso que considerava Boba Fett um personagem um pouco superestimado. Embora seja parte-chave da trama especialmente no quinto episódio da saga, não acreditava que tinha mais importância que outros como Lando, por exemplo, e não entendia o porque de ser tão adorado pelos fãs de modo geral. Talvez a fama que Boba carrega dentro da própria estória e o visual de sua armadura mandaloriana contribuíssem para tal.
Pois bem. Se talvez Boba não fora devidamente explorado no arco de filmes, é de certo que o caçador de recompensas possui uma leva de ótimas aventuras no universo expandido de Star Wars - especialmente nos quadrinhos.  E algumas destas histórias estão reunidas em Laços de Sangue e Boba Fett Está Morto (imagem acima), recentemente lançadas pela Panini aqui no Brasil.
No arco principal desta minissérie (que batizam as duas edições supracitadas) Boba Fett não só mudou minha opinião como se tornou um de meus personagens favoritos. A trama se passa em dois momentos distintos: vinte e dois anos antes da batalha de Yavin (no período referente ao episódio II) e posteriormente um ano antes de Yavin, época precedente ao episódio IV. Ou seja, num primeiro momento, a trama aborda Jango Fett e Boba ainda criança, em uma missão na qual o então maior caçador da Galáxia (Jango) descobre que um de seus clones "saiu da linha" e decidiu optar por levar uma vida comum, criando uma família - o que irá refletir diretamente na vida de Boba Fett vinte anos depois.


A HQ explora um ponto importantíssimo da essência do personagem: como ele lida com o fato de ser um clone de Jango, e não um filho legítimo, embora tenha sido criado como um, e exatamente por isso se tornou tão bom quanto o pai naquilo que faz. A descoberta da existência de um "laço de sangue" deixado por aquele clone de seu pai muda a relação como o personagem enxerga a si mesmo, mas sem abandonar sua essência. Os fatos decorrentes na primeira edição refletem diretamente em Boba Fett Está Morto, estória que se torna ainda mais interessante que a primeira ao mostrar detalhes importantíssimos do passado de Boba.
Os roteiros de Tom Taylor e a arte refinadíssima de Chris Scalf, extremamente realista e fiel aos filmes, contribuem para tornar estas HQs épicas. Além disto, os volumes da Panini também reúnem outras histórias de Boba Fett publicadas nos anos 90 e início dos anos 2000, bem interessantes e que mostram um pouco mais da "fodacidade" do personagem.
Recomendadíssima para quem é fã ou não de Star Wars e Boba Fett, pois é uma ótima forma de conhecer melhor um dos personagens mais cultuados do cinema e mais um pouquinho do já gigantesco universo concebido por George Lucas.







Excelente!

domingo, 18 de janeiro de 2015

ABRIL DESPEDAÇADO

 "A mãe costuma dizer que Deus não manda um fardo maior do que nóis pode carregar. Conversa fiada. Às veze ele manda um peso tão grande que ninguém guenta."

Por André Betioli


Baseado no romance homônimo do albanês Ismail Kadaré e adaptado para o cenário do sertão brasileiro por Walter Salles, Abril Despedaçado é um filme que pode entrar na sua lista dos favoritos, e querer rever daqui um tempo.
A trama se ambienta por volta de 1910, no sertão nordestino. Cercados pelo clima árido, escassez de recursos, e violência, conhecemos duas famílias rivais: os Breves e os Ferreira. Desde outros tempos, de gerações anteriores, as famílias vivem em um eterno conflito por disputa de terra. E a maneira que eles usam para determinar o vencedor é seguindo a tradição de que uma das famílias deve matar um membro da rival. Ao fazer isso, a família penalizada tem o direito de tirar uma vida da outra.Ou seja, o filme começa com a morte do filho mais velho dos Breves, e logo vai caber a Tonho (Rodrigo Santoro), filho do meio, a missão de vingar a morte do irmão. Só que ele sabe que assim que o fizer, devido a tradição e as regras, pouco tempo de vida lhe restará, pois ele será o próximo alvo. O prazo é determinado pelo tempo em que o sangue da camisa da vitima (que fica pendurada em um varal) muda de cor, do vermelho para o amarelo desbotado.
A realidade em que as famílias se encontram é extremamente difícil. Dá para sentir o quão pesado é o fardo que os personagens carregam. Pacu ou "Menino" (Ravi Ramos Lacerda), irmão mais novo de Tonho, uma criança, levanta a questão de que Tonho deve fugir assim que fizer sua missão, já que não quer ver seu irmão morrer. Então, a partir daí Tonho, até então com 20 anos, percebe que logo terá de se deparar com essa imensa responsabilidade. O medo começa a tomar conta de seu ser, e pela primeira vez, em sua vida e com o prazo se estreitando, ele percebe que nunca "viveu" de verdade. Nunca aproveitou algo bom da vida. Não conheceu o amor. Nunca se apaixonou ou se decepcionou. Não viu o mar. Não conhece a arte. E tão pouco sabe o que é a liberdade. Perto do fim iminente, Tonho passa a se perguntar, o por que de tanto sangue derramado? Qual é o sentido de tudo isso?
Em meio a uma narrativa simples, mas que em determinados momentos é poesia pura, juntamente com uma fotografia incrível (acho que o sertão nunca esteve tão bonito), recheada de simbolismos,  e a atuação excepcional de todo o elenco, claro com destaque para Santoro e Lacerda, faz deste filme uma obra  única, daquelas que merecem ser lembradas e ressaltadas. Ah sim, a sequência final do longa é simplesmente perfeita. É quase impossível não se emocionar.



Perfeito! Uma obra prima do cinema nacional!

quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

OS CAVALEIROS DO ZODÍACO - A LENDA DO SANTUÁRIO



Por Diego Betioli

"Seiya e os outros atravessam as doze casas do Santuário para salvar a Deusa Athena..."

 A frase foi repetida inúmeras vezes ao longo dos 73 episódios da primeira e mais épica saga de Cavaleiros do Zodíaco, anime que virou febre instantânea no Brasil nos anos 90 e fez parte da infância de muita gente (inclusive deste que vos fala). Apesar de ser exibido como um "desenho" comum, CDZ possuía alto teor de violência, e a ausência desta é apenas uma das inúmeras diferenças entre a série animada e o filme em CG lançado no ano passado, vinte anos depois da explosão de sucesso brasileira e quase trinta após o lançamento do mangá e do anime no Japão.
 O anúncio da adaptação da saga de, como já citado anteriormente, 73 episódios em um filme de 93 minutos dividiu opiniões e gerou desconfiança. Seria ousadia ou ingenuidade conseguir converter todo o conteúdo de um enorme arco - embora boa parte de seus episódios sejam apenas de batalhas - e esperar que o resultado fosse positivo e satisfatório para o público. Mas, para entrar nesse mérito, é necessário entender justamente qual é o público deste filme.
 Se CDZ não sai da memória do fã brasileiro, nostálgico por natureza, no Japão o anime/mangá já não é tão popular há alguns anos. Algumas recentes tentativas de ressuscitar a franquia fracassaram, como o anime Omega, continuação da série original que agradou a pouca gente, e a série Lost Canvas, que retrata a Guerra Santa anterior, na qual Dohko e Shion lutaram. Este possuía uma qualidade imensamente superior ao de Omega e apresentou novos e bons personagens, mas acabou sendo cancelado por falta de audiência, embora o mangá tenha tido continuidade.
 Com essa problemática em vista, acreditou-se ser preciso apresentar CDZ a um público novo. Mais jovem, que, basicamente, não tivera nenhum contato com a série original. Daí surgiu a ideia de adaptar a principal saga do anime - a primeira - seguindo  a ordem cronológica do anime, o que possivelmente abre caminho para futuras sequências, que também devem seguir as demais sagas do cânone original.



 E é neste ponto que o público se divide entre "possíveis novos fãs" e "nostálgicos/fãs clássicos". Se você se enquadra no segundo, dificilmente o filme lhe agradará. Basicamente, a saga é triturada em um liquidificador para que o mínimo essencial da estória possa caber em uma hora e meia. Tudo acontece tão rápido que fica difícil se empolgar ou gerar qualquer empatia pelos personagens, especialmente por Seiya e Saori. Outro fator que incomoda ligeiramente são as piadas fora-de-hora, que teimam em aparecer com alguma frequência justamente durante as batalhas no Santuário, momento em que a carga dramática deveria estar elevada.
 Não obstante, há mudanças em pontos cruciais da narrativa original e na personalidade e aparência de alguns personagens. Entre as mais notáveis está a mudança de Miro para uma mulher, em uma possível tentativa de gerar mais empatia com o público feminino, e a transformação de Máscara da Morte, o mais cruel dos doze dourados, em um sujeito espalhafatoso e "engraçadonho". [SPOILER] Afrodite é simplesmente descartado, tendo uma morte rídicula e durando pouco mais de alguns segundos na trama. Saga, por sua vez, "evolui" no fim para uma criatura ao melhor estilo "chefão de God Of War", algo totalmente desproporcional ao universo de CDZ. [/SPOILER] Outros personagens, como Ikki, possuem pouquíssima relevância na trama.
 Todos estes pontos são apenas algumas coisas que podem incomodar os fãs mais ávidos, mas que, como já salientado, podem passar despercebidos por um público realmente novo. Os pontos positivos também devem ser ressaltados: a animação é excelente, com uma qualidade gráfica impressionante e extremamente bonita. Os personagens, bem como os cenários, parecem incrivelmente vivos, e o mesmo pode se dizer dos poderes e golpes especiais despejados pelos cavaleiros - um verdadeiro espetáculo visual. Por sinal, as batalhas, embora muto breves e nem de longe violentas como no anime, são muito bem feitas e podem ser consideradas o ponto alto do longa. As armaduras dos Cavaleiros de Ouro são outro show à parte, ricas em detalhes e com ótimo acabamento (a de Aldebaran é uma das mais bonitas). E a versão dublada conta com as vozes originais de praticamente todos os personagens.
 De todo modo, o filme sucita a velha discussão em torno da necessidade de reboots, de se repaginar clássicos para apresentá-los à nova geração, algo que já se tornou comum em Hollywood. O que acontece é que certas obras possuem caráter atemporal, de maneira que, independente da introdução ou retirada de elementos contextuais, sua qualidade e fama serão sempre postergadas para as gerações seguintes. Ao menos no Brasil, CDZ é um destes casos, mas vale lembrar que isto muda de país para país e, consequentemente, de cultura para cultura.
 Em suma, A Lenda do Santuário deve ser visto, por ambos os públicos, como um filme à parte do cânone original, sem compromisso, capaz de render alguma diversão ao espectador.








Razoável

quinta-feira, 8 de janeiro de 2015

CHEF


Por Diego Betioli

Despretensão. Este é o segredo do filme Chef, dirigido, produzido, escrito e protagonizado por Jon Favreau (Homem de Ferro 2), e que pode ser considerado facilmente uma das melhores produções de 2014.
 Como sugere o título, a trama gira em torno da culinária, mais precisamente sobre o drama do chef Carl Casper (Favreau). Carl é um conceituado chef que trabalha a serviço de um renomado restaurante na Califórnia, onde possui grande prestígio com sua equipe de cozinha e uma amistosa relação com Molly (Scarlett Johansson), a hostess do estabelecimento. No entanto, Carl sente-se limitado pelas exigências de seu chefe, Riva (Dustin Hoffman), que não permite sua liberdade criativa na cozinha e acaba restringindo-o a preparar sempre os mesmos pratos. E tudo vem por água abaixo quando um famoso crítico decide experimentar o cardápio do restaurante e o detona.
 A tensão profissional de Carl é aliada com a relação insossa que possui com o filho, Percy, e a ex-mulher Inez (Sofia Vergara), em função da obsessão pelo trabalho e a frustração profissional, de modo que o garoto é sempre deixado em segundo plano. Embora passe um tempo com o filho aos finais de semana, Carl é ausente, e age de modo mecânico e indiferente com a criança.
 O ponto de mudança da trama ocorre quando Carl se vê no fundo do poço e percebe o quão distante se tornou do filho, o qual reconhece como apenas um desconhecido para si. E é na tentativa de reaproximação com o menino que o personagem acaba se reencontrando, ao acatar a ideia da ex-mulher de cozinhar em um food truck e, finalmente, fazer aquilo que sabe e o que deseja na cozinha.


  Há diversos pontos que tornam o filme extremamente prazeroso de se assistir. A narrativa é leve, recheada de toques de humor, e, embora o roteiro pareça previsível, não se torna cansativo em nenhum momento. A abordagem humanista do "fazer o que se gosta", mesmo que isto signifique desapego de posições sociais e a suposta satisfação profissional em colocação hierárquica (que na maioria das vezes não condiz com a satisfação pessoal), é o ponto-chave da trama, levando o expectador - muitas vezes identificado com situação similar - à reflexão. A mudança profissional ocorre de forma positiva na vida de Carl ao mesmo tempo - e também em virtude - da participação de seu filho em todo o processo, e em determinada cena este apogeu em sua vida é facilmente constatado, quando Percy nota a incontrolável felicidade no pai até então sisudo e infeliz, e também sorri.
 O bem-humorado Martin, cozinheiro e fiel escudeiro de Carl, é o principal alívio cômico do filme e também rouba a cena, sendo muito bem interpretado pelo ator John Leguizamo (O Peste). Robert Downey Jr., que trabalhou com Favreau em Homem de Ferro e Vingadores, também faz uma ponta no filme.
 Outros destaques são a ótima trilha sonora, que conta com 21 faixas e vai de jazz à música típica cubana. E claro, os pratos - uma verdadeira "pornografia culinária", no ponto de vista de que se torna explícito a "nudez" das refeições na tela. É impossível ficar indiferente e não sentir fome durante todo o filme (portanto, esteja bem servido ao assisti-lo).
 Este é mais um daqueles filmes que passam despercebidos, mas que certamente merece um olhar carinhoso. Vale reservar algum tempo - e o estômago - para apreciar essa obra.







   Excelente!